quarta-feira, 8 de junho de 2011

Uma ave chamada Alegria

Era uma vez uma avizinha ainda muito jovem que vivia em uma pequena floresta junto com seu pai. Esta ave, desde muito cedo demonstrava sua inteligência e inquietação com as coisas a sua volta. Enquanto muitas outras aves de sua idade ficavam a voar sem destino, apenas aproveitando o prazer de voar, esta, devorava livros e mais livros, que seu pai, muito satisfeito, sempre lhe oferecia.
Os filósofos da antiguidade eram-lhe familiares e vezes ou outra eles iniciavam discussões demoradas, eram duas gerações a juntarem conhecimentos, não a se conflitarem. O papai pássaro se esforçava muito para entender o que se passava na mente daquela avezinha. Algumas vezes não entendia, sentia-se até incapaz, mais não desanimava.
Ela por sua vez tinha muitos sonhos. Acreditava que a forma como via as coisas era a única certa e fechando-se em si mesma, como uma ostra, acreditava que estaria imune as coisas do mundo as quais ela detestava. Acreditava que nunca iria mudar e, que sua missão era abrir a mente das multidões. Fazê-los entender de que a maneira como eles agiam não era a certa.
À medida que ela crescia, suas penas ficavam mais coloridas, suas asas mais fortes e um desejo cada vez maior de abandonar aquela floresta, que segundo ela, era ocupada por aves que não a entendiam e, não podiam lhe proporcionar maior crescimento.
Ela vislumbrava uma grande e antiga mata. De lá já há séculos saiam às ideias que revolucionavam todas as coisas. Lá, haveria de ter muito mais aves que pensavam como ela. Lá ela conseguiria aliados, aprenderia muito e finalmente estaria em um lugar que poderia lhe fornecer tudo de que ela precisava.
Seu paizinho ouvia todos os seus anseios e sempre que percebia uma brecha, ponderava os seus pontos de vista, porém nunca dizendo-lhe que ela estava totalmente errada, mas sim, chamando-a a reflexão sobre alguns pontos que ele achava importante.
Assim eles viviam naquele imenso ninho que desde que a mamãe pássaro havia partido, era triste e solitário.
Agora a avezinha estava finalmente crescida. Em alguns dias alcançaria a sua maioridade e suas asas não se continham mais. Era como Fernão Capela Gaivota, precisava alçar grandes altitudes e romper distancias. Na grande floresta do Norte ela seria finalmente feliz e, no último dia daquele ano ela iniciou a grande jornada.
Seu pai viu-a subir, subir, subir, até que seus olhos não a avistaram mais. Seu coração bateu descompensado e sua respiração quase parou. Sabia que teria pela frente mais uma grande saudade e não sabia se aguentaria isto.
Ele não conseguiu ficar mais naquele ninho, sem suas princesinhas e decidiu também que precisava partir. Soube de uma floresta muito distante que precisava de quem pudesse ajuda-los a se reconstruírem e para lá partiu também. Naquele ninho outrora feliz, agora havia só um imenso vazio. Suas paredes ficaram frias, suas cores esvaneceram-se.
Hoje ela anda pelas ruas e praças geladas do Velho Mundo e percebe que aquele gelo não aqueceu o seu coração. Ali ela pôde ver e conviver com aves de todo o mundo no entanto, em um dia qualquer se deu conta de que eles não eram melhores do que ela não. Na verdade, entendia agora que lá no pequeno bosque em que vivia, haviam muitas aves melhores do que aquelas. Que não é o lugar em que se vive que nos fará felizes mas, sim o rumo que damos para a nossa vida.
Naquela noite, presa a inúmeras indagações, o sono demorou novamente a chegar. Quando finalmente dormiu, sonhou que estava de volta à seu ninho. Sentiu-se aquecida como já a muito não sentia-se e, quando olhou para fora viu todos os habitantes do bosque reunidos ao seu redor. Eles estavam todos em silêncio e seus olhares apontavam para ela. Foi ai, no mundo de Morfeu que se deu conta de sua missão. Todos aqueles que lhe esperavam ávidos, eram o seu povo. Ali estavam enterrados os seus antepassados. As plumas de seus pais ainda flutuavam por ali e, se ela queria transformar as coisas, por que não começar por suas origens? De que lhe serviam tantos conhecimentos se, os guardava só para si?
O ambiente a sua volta mudou. Ela agora havia retornado a Grã-Bretanha. Sentada em um barco sobre o rio Tâmisa, viu que a paisagem a sua volta começou a desmoronar. A primeira a cair foi a “Torre de Londres” e com ela todas as suas histórias de atrocidades e poder. Depois caiu o Big Ben, cujo sino gigantesco rolou até o rio. Em seguida viu a London Bridge cair por sobre o navio de guerra Belfast, afundando-o também. Assim, a medida que via tudo ruir, sentia ruir também suas velhas estruturas.

No outro lado do Pacífico, seu pai estava envolvido em grandes cismas. Já não a via há quase seis meses e a saudade já não lhe cabia mais no peito. Ele sentiu uma enorme vontade de abraça-la, de tocar o seu rosto com suas mãos, de sentir o seu calor e de ver o seu sorriso. Olhou para o calendário e contou os dias; ainda faltavam quase três meses para isto fosse possível. Suspirou, baixou a cabeça e seus olhos se inundaram. Saudade, como ele sabia bem o que era isto.

Ela acordou ofegante e, por alguns minutos não sabia onde se encontrava. Por fim, seus pés tocaram o chão do lugar onde morava agora, se dirigiu até a janela e, olhando a cidade de dois mil anos ao seu redor, sentiu que aquele não era mais o seu lugar. Decidiu voltar.

Port-au-Prince, 08 de junho de 2011.

Um comentário:

  1. Lendo esse post lindo acima, se me permite um comentario ai vai, uma borboleta so sai do casulo qdo esta preparada para alsar seu voô ,se qdo alguem tenta abrir esse casulo sem esperar a hora certa permitida pela naturesa e força de algum modo esse momento,ai a pobre da borboleta ficará franca durante seu voô e nao desenvolvera suas asas fortes, se sentindo fraca e deslocada. Assim somos nós, levamos nossas lembranças aonde quer que estivermos pois nossas lembranças boas ou más fazem parte da nossa historia. ate bjs

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