domingo, 27 de novembro de 2011

O melhor abraço do mundo.

Na laranjeira ao lado, o sabiá fazia a sua alvorada de todas as manhãs de Primavera, mostrando a seus filhotes ainda pouco plumados, como se deveria começar o dia e, os primeiros raios de sol pediam licença as nuvens para aquecer a vida na Terra. Acordei. Levei a mão ao meu peito, como se este gesto pudesse diminuir um pouco da dor. Foi inútil.
            Mais uma noite de sofrimento... Novamente eu te procurava e você fugia de mim. Se mostrava indiferente a minha presença, me rejeitava. Quantas outras já havia sido assim? Quantas eu ainda teria? Não sei... Repentinamente assaltou-me a mente a lembrança do melhor abraço do mundo...
           
            Os dias atuais são marcados pelo automatismo de nossas ações. Quase todos nós, não nos permitimos o desligar das tantas coisas que teremos que vencer. São as tarefas do trabalho que, materializadas em metas nos impelem a agirmos nos limites de nossas forças físicas e psicológicas. São as responsabilidades com os estudos, que muitas vezes nos fazem avançar a madrugada e sacrificar nossos finais de semana, para podermos dar conta de tantas leituras, trabalhos, provas. São as relações familiares, as responsabilidades com os filhos, cônjuge, as tarefas de casa, que nos desatentos, fazem com que passem o tempo que lhes resta dentro do lar, sem dar-se ao prazer de curtir aquele ambiente e as pessoas que lá convivem.
            Estes exemplos e tantos outros, vão ao longo do tempo nos tronando como robôs. Se nos filmes de Holiwood os robôs tornam-se gente, na vida real acontece o contrário, somos nós que nos tornamos robôs ,e talvez tenha sido esta a mensagem que os diretores querem nos passar.
            Mas afinal, o que caracteriza em robô? - É a ausência de sentimentos, responderia você. É isto mesmo... Um robô trabalha com perfeição, não reclama de nada, só executa, pois não precisa de prazer.
            E você, precisa de prazer?
            Vivemos dias em que ter isto já é um luxo. Chegamos ao ponto de já nos acostumarmos a viver sem prazer. A frieza e a indiferença nos tomaram e, pior, nem sequer nos demos conta disto.

            Foi simples assim... Ela sorriu para mim e me abraçou, mas o seu abraço não tinha nada de simplicidade...
            Não foram apenas os seus braços que me envolveram, foi muito mais. Ela é capaz de transmitir coisas que já não estamos mais acostumados a sentir.
            Fiquei paralisado... Perdi o comando sobre o meu corpo, apenas me deixei envolver por seu magnetismo. Passei a viver em outro ambiente. Do urbano passei a um campo florido. Os sons que ouvia agora eram de pássaros, de uma cascata borbulhando ao meu lado. Uma brisa suave me envolvia.
            Aquele abraço me dizia coisas...
- Desejo que suas noites sejam sem pesadelos e que seu amanhecer seja dourado.
- Desejo que de seus olhos não rolem mais lágrimas, mas sim que possam ver a beleza do mundo.
- Desejo que seus dias sejam coloridos e doces como uma fruta madura.
- Desejo que o ar que você respira não tenha mais poluição e sim um cheiro de jasmim.
            Quanto tempo durou? Impossível calcular... Durou o tempo que eu precisava para me sentir cuidado. Para entender que existem pessoas que fazem a diferença neste mundo conturbado e que em um abraço conseguem abalar as nossas frágeis estruturas.
            Eu quis falar... Queria lhe dizer como aquele abraço era gostoso, como me faz bem... Mas as palavras não saíram. Ainda envolto em seu magnetismo, vi-a desprender-se de mim e seguir o seu caminho.
            Sorri para ela mais uma vez e agradeci a Deus por Ele tê-la colocado em meu caminho, por eu tê-la como amiga.

            Quando voltei a mim da lembrança tão doce, percebi que meu peito já não doía tanto. Entendi que, se a vida nos põe em provas, também nunca nos faltam aqueles que nos sustentam, apóiam e até muitas vezes nos carregam.
Se ainda hoje vivemos na condição dos que só recebem, que tal partirmos para a posição dos que também aprenderam a servir?
            Paz e bem!

Lages-SC, 27 de novembro de 2011.

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Germinando...


Não sou exemplo para ninguém, no entanto, inicio o meu dia louvando a Deus pela noite que tive e pedindo o necessário para enfrentar o novo dia e, não perder as oportunidades que ele irá me dar...
Antes mesmo de meus olhos se abrirem, já chegou até os meus ouvidos o canto dos pássaros... Um sabiá amigo, mais disposto do que eu, vem até próximo a minha janela, brindar-me com o espetáculo das doces notas que ele extrai de seu peito vermelho...
Quando saio à rua, vou observando os vários presentes que Deus me deixou, um após o outro, para que o meu caminho até meu trabalho, seja o mais belo possível...
Ao portão chegam os aromas das flores e o vento ainda preguiçoso vem acariciar-me. O João-de-barro, quase toca os meus pés e ao meu: – Bom dia Joãozinho!, abre as suas asas e emite uma seqüência de sons muito característico dele, enquanto seus olhos atentos miram a grama verde a procura do alimento que ele sabe ali existir.
Mais alguns passos apenas e estacato diante do que vejo... Ali está o belo Ipê. De onde saiu tanta beleza? Milhares de flores muito amarelas, formando cachos harmoniosos, dependuram-se no tosco galho, que até a bem poucos dias pareciam desprovidos de vida.

O calor suave do sol da manhã, nos convida que deixemos nossa pele a amostra para a produção de vitaminas muito necessárias, e a medida que nos aquece, também parece que queima qualquer tristeza ou amargura que por ventura ainda, desatentos, insistimos em carregar conosco.
Se é a chuva que vem nos saldar, poderemos notar as pétalas das árvores e flores, como que em forma de concha, deixarem-se molhar. É o banho que esperavam talvez á dias... Recuperam a sua maciez, suas raízes antes contraídas, agora ligeiras, tratam de recolher o precioso líquido mantenedor da vida.

Durante mais de doze horas é assim... Há tantos motivos para olharmos, admirarmos, louvarmos. Basta que tiremos por alguns segundos o foco do que estamos fazendo em nossa correria do dia-a-dia e olhemos para a primeira janela a nossa frente e, lá encontraremos mil motivos para nos alegrarmos...

Você me pergunta como podemos continuar vivendo diante de tantas dificuldades a sua frente... E eu lhe respondo: Que tal mudar de foco? Não somente lá fora, mas também dentro de você existem tantas belezas... Existem pedras das mais preciosas, existem perfumes mais cujos aromas nunca poderão serem reproduzidos pelo melhor dos perfumistas. Em você existem asas, cujas plumas multicoloridas poderão te levar a qualquer das alturas. O seu toque pode ser muito mais suave do que o do vento sobre a superfície de uma pétala de rosa.

TUDO ESTÁ AI EM VOCÊ! Quando decidir-se-á em colocá-las para fora?
Você me pergunta novamente como fazer isto... Que tal começar por agradecer por tudo que tem? Tudo o que é seu, que recebe a cada segundo de vida, e muitas vezes não se dá conta disto?
Olhar para dentro de si mesmo é preciso!

Estarei torcendo por você e não tenho dúvidas de que muito em breve a verei na posse de todas as suas possibilidades.
Para a frente e para o alto!


Lages-SC, 12 de outubro de 2011.

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Chorei como as muheres choram...


Esta noite acordei em meu sonho e você estava ali...
Na verdade, nós dois estávamos ali...
Nos enlaçávamos de tal maneira que, parecíamos um só.
O silêncio envolvia as duas almas que muito se amam
E nenhum dos dois rompia com o silêncio sagrado.

Naquele momento mágico, comecei a chorar...
No silencio de minha alma, comecei a chorar...
As lágrimas antes tímidas, agora jorravam em abundância.
Ela não percebia, grudada em mim, sonhava acordada.
Porque choro se neste momento sou feliz?

Choro pelo tempo em que estamos separados um do outro;
Choro a falta que sinto de você;
Choro por saber que logo após, estaremos separados novamente.
Choro por não pertencermos mais ao mesmo mundo.

Minhas lágrimas molharam os seus braços e você percebeu.
Diferente de mim no passado, nada me perguntou.
Neste momento entendi o porquê de suas lágrimas,
Quando nos dias de antanho seus olhos vertiam águas,
As quais eu não entendia o motivo.

Sonhando entendi...
Porque as mulheres choram mesmo nos momentos mais íntimos.
Elas choram, não pelo momento de felicidade,
Mas por pensarem que talvez no futuro não tenham mais isto.
Nesta noite eu chorei como as mulheres choram.

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Anjos Cuidadores

Em uma bela cidade no alto da Serra Catarinense, rodeada por montanhas e paisagens paradisíacas, existe um lugar muito especial...
Há muito tempo atrás, um coração generoso se inquietava com a inexistência de um lugar onde os pequenos rebentos nascidos naquelas plagas, pudessem se recuperarem de distúrbios da saúde e, receberem um atendimento humanizado.
O ideal de antanho um dia tomou forma e, desde então, tem sido um verdadeiro ninho de amor, saúde e de paz. Quantos pequenos por ali já passaram? Milhares! Algum deles foi dispensado sem atendimento? Nenhum!
As almas queridas que o idealizaram e o construíram, já não vivem mais neste mundo, mas não é por isto que o esqueceram. Analisando as muitas nuanças do trabalho realizado ali, verificaram que para melhorarem ainda mais a qualidade dos atendimentos e a vida dos que fazem parte daquela obra no bem, precisavam de pessoas especiais. Pessoas que fossem capazes de cuidar de quem cuida.
Existiriam estas pessoas? Quem poderia que incumbir desta nobre missão? Além do mais, o hospital neste momento não teria condições para arcar com as despesas destes novos profissionais.
Quando as dificuldades pareciam serem muito grandes, alguém do grupo falou que naquela cidade havia sim pessoas que se enquadravam no perfil requerido. Seres que amavam as suas profissões e que não eram escravos do dinheiro, pelo contrário, gostavam de servir.
Aqueles corações se colocaram em prece, pedindo que o Pai Maior, inspirasse aqueles que fossem capazes de atenderem ao chamado.
Algum tempo se passou...
O mês de maio transcorria com seus dias já muito frios e as folhas das árvores já amareladas começavam a cair. O sol já não aquecia como antes e o frio Minuano já dava seus primeiros sopros, quando quatro anjos disfarçados de mulheres comuns chegaram àquele recanto de amor e vida. Dirigiram-se aos responsáveis da instituição e informaram que desejavam contribuir para a melhora daquele lugar.
É claro que os administradores aceitaram, embora ainda não soubessem exatamente o que aquelas profissionais poderiam fazer ali.
Em pouco tempo o trabalho deu inicio...
Dois anjos se encarregaram dos atendimentos nos apartamentos e da sala “Dona Carmem”. Outros dois da sala “Elisa”, “Adelaide” e “Maria do Carmo”. Todos juntos atenderiam a UTI, o Pronto Atendimento, o Pós Cirúrgico e a sala das mães.
O ambiente começou a se transformar...
A partir daquele dia, os servidores dos serviços gerais, os técnicos em enfermagem, enfermeiros, médicos, estagiários e demais profissionais e, principalmente as crianças internas e seus familiares, começaram a sentir o frescor da brisa produzida por suas asas, como também o perfume de suas palavras.
Jovens mãezinhas muito aflitas foram confortadas e contidas. Com os anjos elas podiam falar tudo o que lhes ia ao coração, tirar suas dúvidas sobre a saúde de seus pequenos, pois sentiam que havia interesse por elas.
Quando a morte fez-se presente, um dos anjos se vestiu de muito mais coragem e pintou suas plumas com amor intenso e acocorando os paizinhos apreensivos, pode minimizar-lhes os sofrimentos, mesmo que por dentro chorasse também.
Os feridos, acometidos de queimaduras, necessitados de procedimentos cirúrgicos, com pneumonia, viroses ou qualquer outra intercorrência não ficaram mais sós e agora podiam falar de suas dores, medos, dúvidas.
Muitos dos que ocupam aquela casa, estão lá para cuidar, porém diante de tantas situações em que muitas vezes se confundem como mães dos pequenos ou até os pequenos como seus filhos, não conseguem passar imune e também são abalados em suas estruturas.
Também para estes os anjos estão disponíveis. Com esmero, atenção e carinho, pacientemente lhes ouvem as narrativas. Um fala das dificuldades no relacionamento com o cônjuge, outro trás nos olhos a imagem do fracasso em que se vê perante a educação dos filhos, pois trabalha o dia todo e não pode lhes dar atenção de que precisavam.
Mesmos os que são vistos muitas vezes como deuses também precisam de atenção. Ali um fala de uma contingência ocorrida e da qual nunca havia presenciado. Outro sutilmente pede ajuda, reconhecendo que em sua formação não foi preparado para lidar com as emoções e a complexidade da mente e do comportamento humano.
Ao final da jornada, quando alçam vôo em direção a seus lares, muitas vezes já é noite. O corpo pode estar cansado, mas a alma está leve como nunca.
Quando finalmente descansam seus corpos buscando conciliarem o sono uma sensação de bem estar as envolve, é o prazer de poder ter sido útil, sentimento este que só experimentam aqueles que já aprenderam a compartilhar sem esperar nada em troca.
Em muitos cantos daquela região das serras, muitos corações elevam a Deus suas preces agradecendo a Ele pelos seres que lhes enviou e pedindo que os envolva em sue imenso amor. Este é o pagamento de quem nada esperam. Fazia assim também Jesus.

Obs.: Dedico este texto as psicólogas lageanas Angela, Susane, Roberta e Samanta.

Port-au-Prince, 10 de agosto de 2011.

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Oração da Noite.

Ele abriu a porta dos fundos e os dois meninos saíram correndo em direção ao jardim. A lua minguante quase nada de luz refletia e ele se embrenhou nas sombras. Aspirou fartamente alguns litros de ar, retendo-o em seus pulmões por alguns segundos, como costumava fazer em suas meditações.
A noite de final de janeiro estava agradável e, ele ficou ali inerte por alguns minutos, simplesmente saboreando o prazer de sentir o seu rosto sendo tocado pela cálida brisa.
Seus ouvidos se aguçaram e pode ouvir a musicalidade do vento, onde os galhos da palmeira em conjunto com os da aroeira, davam os tons mais agudos. Um perfume doce encontrou suas narinas e ele, fechando seus olhos, inspirou profundamente mais uma vez.

Deixou levar-se pelas vibrações da natureza, sentindo-se naquele momento uníssono a ela. Os minutos passaram lentamente...
Sentiu uma força lhe envolver, algo o chamava da imensidão. Curvou sua cabeça para trás e abriu os olhos cor amêndoa.
Oh... Que maravilha! Seu campo visual lhe apresentava o zimbório salpicado de diamantes faiscantes. Quanta beleza!
Neste instante seu cérebro muito racional se rendeu aquilo que não tinha outra explicação e seus lábios murmuraram: - Obrigado Senhor!!!
Meu Pai, Pai de todos nós, filhos transviados de teus sábios caminhos.
Obrigado pela benção da vida. Por mais uma vez poder estar estagiando no orbe terrestre;
Obrigado pelo meu corpo perfeito. Corpo que sente as dores da vida, mas que também pode verter águas de emoção diante de um ato de amor;
Obrigado por minha saúde perfeita, enquanto tantos irmãos nossos se arrastam mendigando cuidados alheios, nem sempre atendidos;
Obrigado Senhor da vida, pela minha mente lúcida, que pode armazenar o conhecimento do mundo e que, no entanto, muitas vezes a utilizamos para o delito;
Obrigado pela imensa alegria de ter uma família, quando tantos irmãos nossos jamais tiveram alguém para chamar de pai. Jamais terão um colo de mãe, um irmão, uma irmã, um lar para dizer que é seu;
Obrigado pelo muito que nos mima quando as luzes do entardecer colorem o céu; quando a luz do amanhecer rompe a escuridão e o sol feliz surge a nos aquecer.
Obrigado Senhor pelo amor... Ele é a centelha sua que faz o mundo mover-se. Egoístas que somos, queremo-lo somente para nós, como se ele pudesse esgotar-se;
Obrigado também pela dor, remédio amargo que nos arranca da paralisia da ociosidade, do abrigo da mentira, do esconderijo da maldade e nos coloca frente a frente com nossos erros.
Obrigado sobre tudo pela luz de teus ensinamentos, que nos possibilita hoje já entendermos que é amando que se é amado, que é perdoando que se é perdoado, e que é morrendo que se vive para a verdadeira vida.

As lágrimas que lhe escorriam abundantes pela face, também lavavam sua alma. Naquele momento sentiu que não estava só. Que corações luminosos o vigiavam e sussurros lhe diziam: - Este é o caminho meu irmão! Não é o mais fácil, mas é o definitivo. As dores de hoje são o reflexo do passado delinqüente, como também o esforço de agora serão as luzes de um futuro promissor.

Ele ouviu um choramingo e abrindo os olhos viu os seus dois meninos peludos sentadinhos a sua frente. Eles o olhavam com atenção e davam a entender que queriam agora um carinho. Em um movimento rápido ele atirou-se também sobre a grama e abraçando-os rolaram-se pelo tapete verde. É hora de criança dormir.

Port-au-Prince, 21 de julho de 2011.

sábado, 25 de junho de 2011

Um Amor para Recordar


            Era mais uma tarde de sábado, Eduardo havia chegado em casa já passado de uma hora da tarde, pois estava trabalhando em sua loja. Isto acontecia todas as semanas. Ele comeu sozinho algo que Mônica havia preparado para o almoço e, após escovar os dentes deitou-se cansado sobre o sofá.
            Passados alguns minutos Mônica veio de seu quarto para a sala e olhando o seu amor ali, daquele jeito, ficou meditando sobre o que poderia fazer para tirar Eduardo daquele sofá e proporcionar-lhe algo prazeroso que ele já não fazia há muito tempo.
Ela aconchegou-se junto a ele como somente ela sabia fazer. Agindo como um cachorrinho esperto, foi se ajeitando, ajeitando no pouco espaço disponível no sofá. Ele a envolveu em seus braços e finalmente couberam os dois.
Ficaram ali abraçadinhos por alguns minutos. Naqueles momentos, palavras não eram necessárias, pois seus corpos e a ligação que tinham um com o outro falavam mais que qualquer outra linguagem.
Mônica suspirou de um jeito que sempre fazia, girou sua cabeça em direção ao rosto dele e olhando em seus olhos falou: “- Você me ama?”. Ele sorriu para ela e respondeu: “- Não!”. Sorriu do novo e ficou de palhaçada. Ela voltou seu rosto de volta à posição original, aproximou o seu corpo ao dele com ainda mais força e juntou as suas mãos as dele. Como ela queria ouvir da boca dele um “Eu te amo sim! Eu te adoro, não vivo sem você!”, mas sabia de como era difícil para Eduardo falar de amor... Ele crescera sem ter qualquer experiência com declarações afetivas e agora não conseguia fazer com que as palavras escorregassem por seus lábios. Apesar disto, ela sabia que ele a amava, e muito. Ele não falava isto por palavras, no entanto todas as suas atitudes para com ela afirmavam que sim e isto a confortava de alguma forma, embora sentisse muita falta dos poemas e cartinhas dos primeiros anos.
De repente Mônica teve um insight: - “Dudu, qual tal a gente ir naquele pesque e pague no Vale das Trutas?”. Quando? Perguntou ele animado. Agora, respondeu ela. “- Nós poderíamos pegar a Biz e irmos lá”, provocou ela, pois sabia que ele adorava passear de moto. Ele mudou a expressão de seu rosto para melhor, o cansaço daquela semana de muito trabalho e estudos sumiu e respondeu: “– Então vamos nos arrumar e partir logo, para podermos aproveitar o dia”.

Short, camiseta regata e chinelo eles usaram, ela ainda pegou seu boné. Capacetes vestidos e ajustados e o motor deu partida.
Andaram uns quatro quilômetros e a paisagem rural tornou-se dominante. Era Primavera, o dia estava muito agradável e eles curtiam o prazer do contato do vento em seus corpos. Eduardo estava transformado...
Quem o visse agora, não iria acreditar que há meia hora ele estivesse tão desanimado. Ele acelerava a pequena moto ao seu máximo. De tempo em tempos olhava para trás e sua mão esquerda dava tapinhas nas conchas dela, ela sorria. Em seguida, pressionava suas costas contra os seios dela para provoca-la e ela dava-lhe pequenos beliscões em sua barriga. Assim iam eles felizes.

O trecho de asfalto acabara. Eduardo saiu da pista e entrou a direita por uma estrada de terra batida, ainda teriam oito quilômetros para vencerem, até chegarem ao vale. O lugar agora era composto por diversas fazendas e chácaras. O cheiro da terra e do gado lhes chegava até as narinas e não era ruim não. Ele muitas vezes pensava em diminuir o seu ritmo de trabalho e um dia destes comprar um lugar daqueles para virem passar os finais de semana, mas isto nunca acontecia.
A estrada ia se afinando cada vez mais. Os pinheiros araucárias mostravam-se majestosos ao longo do caminho, como se fossem sentinelas fiéis daquelas paragens e a passagem do casal na motinho azul, muitas vezes chamava a atenção dos moradores que lhes saudavam gentilmente.
Eduardo precisou reduzir, pois algumas vacas ocupavam a estrada. Mais a frente eram as galinhas, que ouvindo o barulho e a rápida aproximação, erguiam suas asas e cocoricando corriam desesperadas.
Agora a estrada era somente um espaço de terra entre a mata. O silêncio daquele santuário era quebrado apenas pelo canto dos pássaros que pulavam de galho em galho.

De repente eles pararam.
Seus pulmões aspiraram sôfregos aqueles ares tão puros. Seus olhos e ouvidos se deliciaram com a visão e o som do que havia adiante... Um riacho descia da montanha por entre as matas e a estrada fez uma pausa para ele.
Mônica falou: “- E agora Dudu, como vamos passar? Ele deu um sorriso maroto e respondeu: “- Por dentro d’água é claro! Mas não vamos cair? Falou ela preocupada. Ele ainda sacana respondeu: “- Isto nós só iremos saber depois que estivermos ali dentro” e sorriu mais uma vez. Mônica estava com medo, mas já conhecia Eduardo o suficiente para saber que ele estava era tirando onda com ela e que não iria coloca-la em perigo, embora algumas vezes os planos dele não dessem certo. Ele engrenou a marcha e ela apertou com força a cintura dele. Eduardo acelerou a Biz com energia e fazendo movimentos de ziguezague venceram o pequeno riacho, tendo ao final somente seus pés molhados. Ele olhou para ela com toda a satisfação de um macho, como a dizer: “viu como sou bom e cuido de você?” Ela sorriu.

Mais alguns metros e ali estava o Vale das Trutas. Eduardo estacionou a moto, eles tiraram seus capacetes e os colocaram no guidom. Olharam a paisagem à volta e cada vez que vinham ali, achavam aquele lugar ainda mais bonito.

Ele olhou para ela com um olhar de quem agradecia... e disse para si mesmo: como ela é linda!
Mônica iria completar trinta e quatro anos, e para ele a cada ano ela ficava mais bonita. Seus cabelos loiros estavam desalinhados devido ao capacete e o vento agora os fazia bailar de acordo com sua música. Mônica percebeu o quanto de amor ele lhe dedicava naquela atitude, prendeu o cabelo e o abraçou.
Os olhos de ambos vislumbraram um pequeno córrego ali próximo e dirigiram-se para lá. Uma calha de madeira recolhia água de uma sanga e depois a descarregava sobre uma roda d’agua, fazendo-a girar desajeitada. Abraçados um ao outro, curtiram aquele lugar e depois se dirigiram para um barzinho rústico que o proprietário havia construído ali. Olharam o cardápio e acabaram por escolher tomar uma cerveja e comer postas de truta. Eduardo e Mônica curtiram cada gole e cada bocado e depois de mãos dadas saíram a passear.

Mônica já acostumara com o espírito aventureiro de Eduardo, que onde ia, precisava redescobrir tudo. Ele tinha que ficar bem na beirinha dos lagos e não se contentando, passou a andar entre os diversos tanques para a criação das trutas, comparando uns com os outros. Ela o observava com atenção e carinho e refletia sobre como ele muitas vezes ainda se comportava como uma criança. Aquele homem menino era o seu grande amor.
Eduardo voltou para junto dela com os pés sujos de barro e com muitas frases iniciadas por “você viu?”. Uma mão procurou a outra automaticamente e continuaram o passeio, quem os observasse ali, pensaria que eram recém-casados, apesar de já estarem juntos há dezessete anos.
Entraram em um bosque. Eduardo viu algumas churrasqueiras e prometeu que viriam ali fazer um almoço em algum domingo. Ficaram parados olhando para um riacho maior que escorria barulhento por entre a mata e depois voltaram ao campo.

O que Eduardo viu em seguida fez com que seus olhos faiscassem. Ele olhava encantado para uma grande árvore a frente deles. De um de seus galhos muito alto, desciam um par de cordas que sustentavam um balanço. Ele olhou para ela e ela entendendo tudo, já foi respondendo: “– Nem venha Dudu, já sei que você quer me colocar ali para me derrubar”. Ele a abraçou forte e respondeu: “– Não meu amor, eu só quero te balançar”. Ela cedeu...

Mônica sentou-se sobre o balanço e como as cordas eram muito longas, para poder balançar, somente se alguém puxasse com outra corda que estava amarrada na cadeira. Eduardo naquele momento se sentia como um príncipe poderoso que iria salvar a sua princesa. Tomou da corda e saiu correndo para impulsionar o balanço. Em seu intento, não viu as grandes raízes da árvore que se espalhavam pelo chão, tropeçou em uma delas e foi parar no chão. Quando Mônica viu a cena, não se conteve. Teve um ataque de rizo que não parava mais. Eduardo no chão, enrolado na corda e Mônica dando gargalhadas. Por fim ele se rendeu e passou a rir também. Depois levantou, inventou uma desculpa qualquer e desta vez tomou cuidado com as raízes.
Eduardo puxava a corda ao máximo, depois a soltava e voltava a repetir a mesma ação. Mônica riscava o ar cada vez mais veloz. Ela curtia cada momento e seu pensamento voltou-se à seus dias de infância. Deu-se conta de há quanto tempo já não fazia mais aquilo. Por fim, Eduardo acabou se cansando de correr de um lado para o outro e sentando na grama ficou olhando Mônica se balançar, parecia uma menina a sua menina.
O Sol já estava baixo e resolveram voltar para casa. Aquele dia nunca mais sairia de suas lembranças.

Poucos meses depois, Mônica partiu... Ficando também partido o coração de Eduardo, que nunca mais cicatrizou. Mas isto não foi o fim deles. Ainda hoje, de tempos em tempos eles se encontram durante o sono de Eduardo, e adivinhe qual é o lugar preferido deles se encontrarem?

Port-au-Prince, 25 de junho de 2011.