quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Chegada ao Haiti - Uma primeira impressão


            Nosso Boeing decolou do meio da selva amazônica e aos poucos Boa Vista e Roraima ficaram para trás, seriam 2:40 h de vôo até o Haiti. Passada uma hora, o imenso tapete verde cedeu lugar para o belo azul do mar e quando eu olhava pela janela, muitas vezes me perguntava se o céu estava acima ou abaixo, pois a 40.000 pés de altitude era quase impossível distinguir entre os dois azuis.
            Quando os meus olhos já estavam cansados de verem sempre a mesma paisagem, eis que uma gigantesca ilha surge no horizonte, era a Ilha Hispaniola, que dividida abriga dois países, Haiti e República Dominicana.
            Quando a altitude a distância ficaram menores, eu pude perceber os detalhes. Lá estava a cidade que seria a minha casa pelos próximos seis meses, Porto Príncipe. A população de quase 3 milhões de habitantes vivia em uma planície junto ao mar, cercada por uma enorme cadeia de montanhas arenosas. O ambiente é muito seco e do avião podíamos ver os poucos rios, com seu leito totalmente tomado pela areia, e quando muito, apenas um filete d’água por ali passava, fedorenta e poluída.
            A beleza das águas do Mar do Caribe, contratavam com a desordem da cidade. Via-se ainda milhares de casas destruídas pelo terremoto recente, e as centenas de barracas onde moram hoje os desalojados pela catástrofe. O verde mínimo e árvores praticamente não existiam, só a pista do aeroporto chamava a atenção naquelas paragens.
            Pousamos e, antes mesmo de estacionarmos, a aeronave já foi tomada por um cheiro bastante desagradável, como a nos prevenir de onde agora estávamos.
            Em cima de uma caminhão militar de 5 toneladas, agora víamos ao vivo e a cores o que tínhamos visto em nossa preparação através de fotos e vídeos. Estávamos no meio dele, um trânsito sem nada a que eu possa comparar. Centenas de carros muito velhos, se misturavam a outras centenas de carros de luxo, principalmente grandes camionetas ou mini-vans. Ali não existe semáforos, guardas de trânsito, sinalização, regras. Cada um, age da maneira que bem entende. As buzinas são acionadas a toda hora. Aqui é um caminhão carregado de entulhos que com pressa, simplesmente passou a andar na contra-mão e quem teve juízo saiu da frente. Nos cruzamentos ninguém para e quem não quiser ficar ali por horas, corta a preferencial e torce para não ser atingido. Pequenos carros com caçamba, que em nosso país são usados para pequenas cargas ou para os “irados” colocarem caixas de som, aqui ganham uma carroceria mais alta e coberta e chegam a transportar em torno de 15 pessoas ali dentro, são os chamados Tape-Tapes. Estes são os veículos de transporte aqui, alguém na rua ergue o braço e ele para. Uma moeda é jogada para o motorista e ele continua sua marcha.
            A fila era enorme. O comboio parou. Crianças e adolescestes que estavam nas imediações, vieram até nós para pedir comida ou “dolá” (dólar). Seguimos novamente em nossas viaturas brancas com a marca da ONU. As marcas do terremoto ainda estavam ali, representadas pelas rachaduras naquilo que ficou em pé, pelos destroços das casas e pela grande quantidade de entulhos nas calçadas. O lixo faz parte de suas vidas e atividades. As ruas secas e poeirentas estão repletas dele e os canais fluviais que as margeiam, estão repletos de garrafas plásticas, papel velho, latas e vidros.
            O ambiente é tomado pela simplicidade e miséria, no entanto vê-se algumas casas cercadas por altos muros e concertinas, são onde moram os que tem posse. Eles geralmente moram fora do centro da cidade, de preferência nas montanhas, porém alguns, arriscam ficar em meio a população.
            Porto Príncipe não tem energia, não tem água tratada, não tem saneamento básico, o esgoto corre a céu aberto, não é por menos que o cólera ceifa tantas vidas diariamente. Chegamos em nossa base. Aqui é primeiro mundo. Fora de nossos muros é outra realidade.
            Após as atividades de organizar as nossas coisas e alojarmo-nos, a noite estava chegando. Olhei por redor de nossos muros procurando as paisagens novas. Fitei as montanhas e me dei conta do que acontecia. Percebi uma grande quantidade de fumaça a pairar sobre a cidade, eram os restos da combustão do combustível queimado pelos carros e pelos motores diesel dos geradores que fornecem energia para o comércio, a nobreza e para as organizações civis e militares. Mais alguns minutos e a cidade escureceu. Um Peace Keeper novato, estreou seus sonhos ali.
 


 

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